- novembro 21, 2022
- Posted by: Rafael Kosoniscs
- Category: Social
Por Bruna Klingspiegel
20/11/2022
Estudo global da Korn Ferry indica que equipes executivas mais diversas são 70% mais propensas a conquistar novos mercados do que as demais
Um profissional negro tem de trabalhar o dobro para chegar ao topo. É o que aponta a pesquisa da Korn Ferry, consultoria de gestão de pessoas, obtida com exclusividade pelo Estadão. Mesmo com as políticas de diversidade em alta nas organizações, o alto escalão parece se manter quase intocável. Apenas 4 dos 500 CEOs listados na revista Fortune são negros, representando menos de 1% do total.
De acordo com Milene Schiavo, diretora de Diversidade, Equidade e Inclusão da Korn Ferry, o dado é ainda mais alarmante quando comparamos com 10 anos atrás, quando o número de lideranças negras nas empresas listadas, apesar de baixa, era de 7 executivos.
A queda, segundo ela, é resultado da falta de ações mais afirmativas, com metas e objetivos claramente estabelecidos. “Hoje existe um foco muito forte na questão do progresso feminino, mas não há, de fato, o estabelecimento de indicadores de metas quando o assunto é a inclusão de pessoas negras nesses cargos mais altos, por exemplo”, ressalta Milene.
No Brasil, segundo a B3, 79% das empresas listadas afirmaram ter de 0 a 11% de líderes negros, enquanto 78% têm de 0 a 11% em cargos C-level. Não há nenhum CEO negro entre as 423 companhias da Bolsa. Da mesma forma, o salário dos profissionais negros chega a ser 43% menor que o dos brancos, segundo o Instituto Brasileira de Geografia e Estatística (IBGE).
O estudo global “The Black P&L Leader”, realizado pela Korn Ferry, ouviu 28 executivos sêniores de P&L – função que, segundo os estudos, melhor prepara um líder para a função de CEO. Segundo o levantamento, 60% dos líderes negros relataram ter de trabalhar duas vezes mais e alcançar o dobro dos resultados em relação aos colegas brancos para ter o mesmo reconhecimento.
Para efeitos de comparação, os líderes negros tiveram a maior pontuação em competências essenciais para o alto desempenho de executivos em relação aos demais líderes da base de dados.
De acordo com Yone Gonzaga, professora convidada da Fundação Dom Cabral, a ausência de pessoas negras em determinados postos de trabalho é resultado de uma série de condicionantes históricas que foram pensadas para que os negros estivessem na base e os brancos, no topo. Segundo ela, os dados só reforçam como o racismo estrutural impacta a vida dos negros no País.
Para Edvaldo Vieira, é preciso destinar orçamento e investir para incorporar o tema no dia a dia das empresas.
Foto: ESTADÃO CONTEÚDO / ESTADÃO CONTEÚDO
Para mudar a realidade e dar espaço para que mais pessoas negras consigam progredir com autonomia na carreira, o CEO reitera a importância da propositividade das empresas para abrir portas e levar cada vez mais profissionais ao topo. “Não podemos só focar na diversidade pela diversidade. É preciso destinar orçamento e investir para incorporar o tema no dia a dia do negócio.”
“Tive várias experiências, como quando um candidato a fornecedor, na sala de reunião, não dirigia a palavra a mim, só ao outro homem (branco) da sala – até se surpreender quando ele me chamou de chefe.
Edvaldo Vieira
Com a meta de ter 10 mil posições de lideranças ocupadas por negros até 2030, o grupo Mover é uma das principais iniciativas para transformar a alta liderança no País. Com 47 empresas associadas, como a Ambev, Heineken e Amil, o movimento promove ações e inclui o compartilhamento de boas práticas e a aceleração dos processos de diversidade, equidade e inclusão. O objetivo é potencializar o processo de aceleração de carreiras de negros e conscientizar líderes quanto ao racismo e os impactos positivos em ir além dos vieses inconscientes.
O que as empresas podem fazer?
A questão da diversidade nas empresas, segundo as especialistas, também passa pelas novas demandas de consumo da sociedade. Não por acaso, o relatório também mostra que as equipes executivas mais diversas são 70% mais propensas a conquistar novos mercados e geram 38% mais em receita de produtos e serviços inovadores. Para Milene, quando a empresa não traz diversidade, ela perde perspectiva. Perde em diversidade de produto e em experiência para o consumidor que também é diverso.
“Estou falando de 56% da população brasileira. Ou seja, você tá trazendo para dentro da sua empresa também grande parte de quem consome o seu produto ou seu serviço. Através disso, você consegue usar essa perspectiva na sua elaboração de portfólio na sua experiência que você vai oferecer para o consumidor”, conclui.
Tom Mendes, diretor financeiro e administrativo do Instituto Identidades do Brasil (ID_BR) separou quatro dicas para ampliar a diversidade em cargos de alta liderança.
- Participação de lideranças negras nos conselhos de administração das empresas. “Hoje é quase inexistente a presença de pessoas negras nessas posições. Acontece que na maioria das vezes quem tem o poder de decisão, hierarquia de prioridades e faseamento dos processos para inserção de novos membros nessas posições não são pessoas negras”, destaca Mendes.
- Programas de Trainees direcionados para profissionais negras. Porta de entrada para cargos estratégicos dentro das empresas, estas iniciativas possibilitam que jovens talentos negros tenham acesso a capacitação e possam crescer rapidamente na escalada da liderança. “Os programas direcionados de trainees são uma compensação rápida em disparidades históricas e precisam ser acompanhados do letramento racial da companhia como um todo”, afirma.
- Programas de Desenvolvimento de Lideranças Negras.Quando se tem disparidades aparentes precisamos atentar e regular essas disparidades de forma enfática e rápida. “As empresas precisam entender o porquê de termos esse cenário desigual, isso vem com treinamento, leitura e apoio muitas vezes de instituições especializadas na temática.”
- Treinamento da alta liderança não negra e negra. Começar o letramento por quem tem o poder da caneta é indispensável para engajarmos executivos e avançarmos na temática racial. “Estamos falando também sobre legado, como essas lideranças querem ser lembradas no futuro, como líderes omissos ou como lideranças que entenderam o problema como algo estrutural e que através do poder que detém conseguiram fazer mudanças concretas”, ressalta Mendes.